segunda-feira, 11 de julho de 2022

Texto de Tere Tavares com Fortuna Crítica

 


Aníbal
Quando a doce loucura de recolher-se o cinge, Aníbal vê-se navegando entre as páginas – fere-as com letras. Os joelhos dobrados: “na centralidade arrisco-me e escrevo ao gosto do que aprecio. Se me ocorrer a subtração desse direito, não haverá grandiosidade e a escrita sairá às avessas – o que poderá conferir-lhe uma beleza trivial, nunca uma beleza grandiosa. O branco, que é toda cor, deve fluir como flauta e como flecha”. Ele não entende nada de física nem de química. De imediato pensa naquele órgão submerso em seu mapa vascular, o não lugar e suas acústicas infalíveis, imaginando-se no infinito que o duplica, aplacados os olhos, como lenços imaturos que o fazem mergulhar continuamente. Porque os pequenos detalhes, normalmente, não são para todos os escribas.
É nesses momentos de harpa que Aníbal segura, no ânimo, a fisionomia inigualável de Rosália. Lembra-a sempre que atende ao seu chamado, no dia quente e imprevisto, ela, radiante num vestido de flores miúdas sobre um fundo negro, ou com outro vestido amarelo cádmio [assemelhado aos alucinantes matizes de Van Gogh], ambos de seda, escorregando nas sinuosidades do ambiente que, de algum modo, imagina eternizar, não querendo esperar como há de ser o que não pode ser. Dizer a ela que lhe arde a negação e, talvez, não decante nunca a retrospectiva que, dia a dia, fracassa na complexidade impensada e não prevista, até que se dissolva a música que não lhe sopra outro nome, outra grafia que não a de Rosália – brotação e bulbo. “Sinto-me um mero transeunte do Tempo –acho o Tempo uma invenção; chamaram a esse vácuo desconhecido de Tempo assim como chamaram Deus ao resto do vácuo que restou. Eu resisto a tudo. Menos à amada que, infelizmente, não é minha”.
Aníbal não perde de ver-se, mesmo depois de um longo e imotivado intervalo. Nada faz com que desmorone a construção que fez de Rosália. [não recorda qual foi o inaugural elemento de que se serviu para isso; e isso não o perturba, nem lhe importa]. Rosália ser-lhe-á, por toda a vida, a alma diurna e feliz de que jamais se apartará por sentir-se inteiramente composto dentro dela.
do livro 'A licitude dos olhos' Editora Penalux/2016/SP

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Fortuna Crítica

Stefania Rossi
Bellissimo connubio tra scritto e dipinto. I miei 
complimenti
 Tere.

Francisco da Cunha
Uma ficção na qual o que mais se salienta são as camadas subterrâneas da mente, do espírito ou de outro nome que o valha. A narrativa fundamente humana é impregnada do sopro poético. Poesia e ficção se confundem numa unidade formal-expressional. O estados da psique dos personagens lembram por vezes a estesia do Poético. Quase se poderia afirmar que a narrativa se nutre da tensão poética, do ritmo, da diafaneidade, da vaguidão onde o lugar por excelência se vai instalar na atmosfera indefinida dos estados d'alma. Na ficção de Tere Tavares, narrativa e poesia se dão as mãos. São indissociáveis e se dirigem aos páramos da própria interioridade da linguagem - centro por excelência da criação de mundos e formas da Realidade imaginada e convincente: desnudamento e sonhos.

Guida Luis
Simplesmente lindo, amiguinha Tere, um texto pleno de requinte, de belíssimos adjetivos e todas as palavras de uma intensidade fascinante! O meu grande aplauso amiguinha Tere, amei este excerto.

Marinella Dina

Eccomi. Come sempre incantata dai tuoi scritti. Ma quanta profondità!!! Tutta una serie infinita di metafore, di sensazioni, di rimandi filosofici. Insomma. Non è solo un racconto di un racconto ma è un uragano che vortica attorno a Annibale e Rosalia e ognuno di noi si ritrova in questi due perchè chi non ha mai pensato ." Mi sento come un semplice passante del tempo - trovo il tempo un'invenzione; chiamarono questo vuoto sconosciuto di tempo proprio come chiamarono Dio il resto del vuoto rimasto. Io resisto a tutto Meno l'amata che purtroppo non è mia ".E allora ecco che Annibale si fa vivo, reale davanti a noi e Rosalia eterea, irraggiungibile, Musa sua irraggiungibile. Non si distingue più prosa dalla poesia. Perchè quando la prosa è poetica è la prosa AL MEGLIO.

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Os meus profundos agradecimentos a esses leitores e leitoras.

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